Prezado acadêmico L. O. S. T.
Realmente não nos conhecemos.
Estou disposto a responder o teu e-mail em razão da
quantidade de pedidos que recebo, semanalmente, de inúmeros estudantes de todo
o Brasil, no sentido de “orientar” trabalhos (artigos, monografias,
dissertações). Assim, este e-mail irá me poupar bastante tempo no futuro.
A forma e o conteúdo do teu e-mail me preocupam muito. E para
além do fato de escreveres, pedindo auxílio, quase como se eu tivesse
a obrigação de te ajudar, pelo simples fato de eu ser, na tua concepção, um “ilustre e renomado pesquisador”
na área das Ciências Criminais – se me conhecesse minimamente saberia como
desprezo este tipo de tratamento, pedante e servil.
As questões que me preocupam efetivamente são: primeiro, o
fato de desconheceres absolutamente as minhas pesquisas sobre o tema que estás
trabalhando e, mesmo assim, solicitar a minha “ajuda”; segundo, o fato de a
pesquisa objetivar, exclusivamente, a publicação de um artigo.
Começo pelo segundo problema.
Nos meus anos de docência recebi inúmeros alunos com
esta demanda: “professor, gostaria que o Sr. me ajudasse a escrever um artigo
sobre o tema ‘fictício’, pois quero demonstrar ‘uma intuição qualquer que tive’. O
Sr. poderia indicar alguma revista?”
A resposta (educada) para esta interpelação é a de que a
publicação de um artigo (ou livro) deve ser a consequência de uma investigação
desenvolvida sob a orientação de um professor pesquisador. Trata-se de uma
patologia, decorrente da lógica gerencialista-quantitativa que impera na
academia atual, que os estudantes (sobretudo de pós-graduação) tenham como
finalidade primeira de um processo de investigação a publicação de um artigo.
Com todo o respeito, estás completamente equivocado. A tua
demanda soa, para mim, como um exemplo típico de oportunismo acadêmico.
Uma publicação, repito, é um dos resultados de
pesquisa. Não pode ser o fim primeiro de um trabalho acadêmico. Uma
investigação séria deve ser realizada a partir de uma motivação sincera que nos
impulsiona na tentativa de compreender um problema que nos toca, nos
sensibiliza. A pesquisa acadêmica parte de um nó que nos perturba. A partir deste problema (nó), nos motivamos a levantar material sobre o tema, ler diversos
trabalhos, buscar autores que enfrentam a questão, encarar o campo (realidade)
para tentar compreender suas inúmeras variáveis.
Penso, portanto, se efetivamente queres a minha opinião,
que não se inicia um trabalho “para publicar um artigo e demonstrar alguma
coisa”; coisa esta que é uma conclusão pré-determinada. Este raciocínio é típico
da lógica inquisitorial que motiva o julgador (ou o pesquisador) a manipular os
fatos para comprovar uma hipótese – “primado das hipóteses sobre os fatos”, nas
palavras de Cordero. Aliás, a tua autoproclamada posição “crítica” e
“garantista” não estaria exatamente no sentido oposto ao raciocínio
inquisitório que define metodologicamente a tua pretensão?
Note que esta fragilidade da tua demanda acaba sendo
revelada no fato de não conheceres absolutamente nada do que eu produzi sobre o
tema. Há mais de década escrevo sobre penas, prisões e punitivismo. Dê uma
pesquisada no meu lattes e veja as publicações – aliás, registro acadêmico que
tu e o teu professor orientador não possuem, pelo que pude notar no sítio do
CNPq. Mais simples ainda: ouse perder 5 minutos do teu valioso tempo e consulte
o meu blog e terás acesso às minhas publicações (quase todas). E depois de ‘consultar’ os
meus textos (talvez ‘ler’ seja exigir demais), não me escreva novamente pedindo
material. É só dar uma olhada na bibliografia que utilizei e verás os autores
de referência que fundamentaram minha pesquisa. Não deve ser muito difícil
compreender a lógica deste tipo de procedimento de pesquisa, não?
Sinceramente, fico assustado quando pessoas me pedem
auxílio sem sequer se preocupar em saber se escrevi sobre o tema. Aliás, um
efetivo diálogo acadêmico aconteceria se você, após ler os meus textos,
escrevesse para mim para discutir alguma das minhas ideias (por mais
equivocadas que sejam). É isso que se espera de um pesquisador.
Assim, sugiro, se efetivamente queres ser um "acadêmico", como proclamas na tua ‘missiva eletrônica’, que mudes radicalmente a tua
postura e as tuas prioridades. Mas se queres apenas “mais uma” publicação no
currículo, para fazer volume em uma eventual seleção de mestrado ou concurso
público, delete este e-mail e siga as coordenadas traçadas pelo teu orientador.
Saudações acadêmicas
Salo de Carvalho
Excesso dos beijos que apareceram na mídia brasileira!
ResponderExcluirSeria "L.O.S.T." uma abreviatura trocadilho, vaticínio ou acaso?
ResponderExcluirAbração
Luiz Alberto
Caramba!!! Muito bom!!!
ResponderExcluirFazer qualquer pesquisa envolve mais que a vontade de ter um título. O aluno precisa estar envolvido, buscar novas fontes bibliográficas e desenvolver ainda mais o que já foi escrito sobre o tema. A vontade suprema de fazer um excelente trabalho é realizada, quando há dedicação do aluno. Fiz mestrado e tenho minhas pesquisas para uma futura publicação. Tive muita sorte com a ótima orientação de um grande Professor.
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