Um
movimento plural que tomou as proporções gigantescas que vimos nesta semana,
não deixa de ser, em alguns momentos, contraditório. Inclusive porque a sua perspectiva,
que inicia com a luta pelo direito ao transporte público (passe livre), é a da
não-exclusão de outras causas relevantes.
A luta
pelo transporte público é uma forma de luta pela inclusão social, circunstância
que indica(ria) um norte relativamente definido às manifestações.
Vejo
com certa preocupação, mas sou reticente e cauteloso em afirmar que o
“movimento” tomou um “rumo direitista”, apesar de reconhecer que algumas
bandeiras nitidamente autoritárias emergiram nas Marchas, como os discursos
genéricos “contra a impunidade e contra a corrupção.” Discursos que possuem uma
nítida perspectiva “law and order”.
Mas
indago: (a) o fato de “gente de
direita” estar frequentando as manifestações deslegitima o movimento
contestador que foi construído nos últimos anos?; (b) os novíssimos movimentos
sociais não possuem capacidade crítica de se imunizar das “tentações
autoritárias”?
Espero,
sinceramente, que tenhamos condições de manter o rumo libertário/emancipatório
das manifestações e que os coletivos organizados consigam preservar suas pautas
originárias. Manter a perspectiva crítica/problematizadora, porém, não
significa defender uma espécie de “purismo de esquerda”, sobretudo porque
algumas pautas são compartilhadas por grupos de diferentes orientações
ideológicas que, desde o meu ponto de vista, não podem ser simplesmente isolados
ou excluídos do processo.
A luta
contra o racismo, a homofobia, a misoginia e o patriarcalismo; a defesa do meio
ambiente e da preservação do espaço público para as pessoas; e a necessidade
ampliar as políticas de inclusão social, parecem ser pautas concretas que
agregam vários setores da sociedade. Desta forma, estas pautas podem criar uma
agenda interessante que amplie algumas “zonas de consenso” para que se possa,
efetivamente, avançar na construção de uma país mais justo, com menos desigualdade.
Neste
cenário, penso que é possível identificar uma bandeira bastante e
suficientemente clara que unifica as distintas demandas democráticas presente
nas manifestações: a defesa dos Direitos Humanos.
Mas é
inegável que esta bandeira possui uma dupla dimensão: positiva, de defesa dos
Direitos Humanos; e negativa, de intolerância radical contra qualquer forma de
violação dos Direitos Humanos. Creio que o limite negativo constitui-se como a
fronteira de intolerabilidade. Aquilo que não se pode transigir ou negociar.
A luta pela preservação dos direitos e das garantias fundamentais de todos é o meu norte, é o que me move, é o que me faz marchar.
A luta pela preservação dos direitos e das garantias fundamentais de todos é o meu norte, é o que me move, é o que me faz marchar.
3 comentários:
O problema, Salo, é que, apesar da defesa dos direitos humanos ter de fato o potencial de unificar algumas demandas que emergem das manifestações, infelizmente, para alguns, ela gera a seguinte questão: direitos humanos para quem? Em terra brasilis, onde "uns são mais iguais que os outros", as respostas a essa pergunta, e mesmo o fato dela poder ser formulada, já são um ponto de dissenso difícil de ser superado. Também tenho tentado encontrar algo que possa servir como zona de consenso (inclusive para quem alinha mais à Direita) e o mais próximo que cheguei foi pensar em termos de ampliação e criação de novos espaços de cidadania. Talvez a luta que todos temos em comum seja a de garantirmos espaços de luta. Para além disso, tudo é passível de disputa, até mesmo os direitos humanos (e convencer a todos que, humanos, todos somos, é mais uma dessas lutas).
Mestre, muito bom o post. Estou de acordo contigo, agora, a única contradição seria a questão da reversibilidade dos discursos de defesa dos Direitos Humanos presentes, por exemplo, nas ideologias autoritárias de cunho law and order, como bem citaste. Por mais que tenha-se em mente a defesa de um tal direito, não pode haver superposição de um frente ao outro, como quer esta vertente.
Por sinal, inclusive postei no Ciências Criminais & Paz, a contradição de aaqueles que não querem nenhuma violência nas manifestações serem os mesmos que rogam por punição violenta de criminosos no cotidiano, a exemplo das every day theories, desde Baratta.
Forte abraço!
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